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sábado, 3 de setembro de 2011

Diário da Manhã - Dia 4/9/11

MESMICE POUCA É LUXO

Lêda Selma

Estava decidido: daria um giro no dia para que tudo saísse do trivial. Rotina muita asfixia, e causa até indolência. Há coisas que não mudam, sai dia, entra noite. Que canseira! Porém, antes de qualquer iniciativa minha, o telefone estrilou, e uma voz falseada abordou-me: – Bom-dia, senhora! Posso estar falando com a senhora um instante? –. “Estar falando”? Não, não pode! Proíbo-a de fazê-lo! Desliguei a chamada.

Liguei a televisão. Quem sabe, um bom filme, na TV fechada, para defuntear o tempo, pois encontrava-me em repouso, sob ordens médicas. Oba!, um do gênero policial, com muita ação, perseguições, investigação, enfim. Ah! nem...! De novo, a rotulada briga pelo poder na área, entre um investigador e outro, e o tal carro da polícia, em perseguição ao do bandido, explodindo após deparar-se com uma jamanta que lhe interceptou a passagem?! Que falta de criatividade, cruzes! O perseguido? Safou-se, claro! mais uma vez. Esses filmes americanos... Francamente!

Melhor, decidi, buscar um bom programa esportivo. Ih!... Não dei sorte! O canal reprisava entrevista de um jogador de futebol, e aí, só Deus para moucar meus ouvidos e poupá-los do tal “Com certeza!” e de seus complementos.

– Você chutou sem direção, parecia desligado da partida, aliás, todo o time estava displicente, o que houve? – quis saber o entrevistador.

– Com certeza! Chutei bem, a trave é que tava de implicância comigo, mas fiz um bom jogo. Todos tão de parabéns, até o azar! Agora, é levantar a cabeça, com certeza!”

Eu, sim, levantei a minha, e, novamente, mudei de emissora. Ah! que bom, aquele casal simpático e seu gostoso “Boa-tarde!”! Iniciava-se o jornal televisivo. Primeira reportagem e... “É preciso encarar de frente a realidade...” (como seria encarar de costas?). Não aguentei!

Passei para a novela. Uma, outra e... o mocinho apaixonado pela moça rica! No auge do romance, fulano descobre-se irmão da beltrana, ou então, mais um filho esconde a mãe por sentir vergonha da pobre! Eita autores originais, benza Deus!

Como última tentativa, dirigi-me ao computador para vistoriar os e-mails. Nossa, quantos!? Um deles, de uma aluna de certa escola municipal, atarantou-me. Analfabeta que sou no léxico internético, fiquei mais baratinada que eleitor atrás do eleito para cobrar-lhe aqueeeeelas promessas de campanha. Abro parêntesis: por falar nisso, olá, prezado vereador amigo, cadê o projeto que dará a um logradouro municipal o nome de minha mãe, Profª Lousinha Carvalho, uma das pioneiras na Educação em Goiânia, e que, durante quarenta e dois anos, atuou na área como professora, diretora, presidente do Mobral, com dinamismo, competência e senso inovador, o que lhe valeu destaque nacional... E então?! A promessa está prestes a completar dois anos e até agora... Olhe, aquela outra... ah! esqueça, vou dar-lhe pouso em meu arquivo morto, certo? Fecho os parêntesis. Bem, ao e-mail: “Oi, Ld, bd! Gt de s plt. Vc é bcn d+ e mt dvt. Tb adr s lv q é btt egçd. Vt sp. Obg. Bj”. Que língua é essa, santo protetor dos desentendidos?! O jeito, procurar um tradutor. Alguma coisa, ele traduziu, mas outras... Em última instância, recorri à e-mailizadora que, a princípio, mostrou-se desentendida de meu desentendimento. Aí, o pequeno texto saiu das sombras: “Oi, Lêda, bom-dia! Gostei de sua palestra. Você é bacana demais e muito divertida. Também adorei seu livro que é bastante engraçado. Volte sempre. Obrigada. Beijo”. Ufa!!!

Mais uma tentativa frustrada: não consegui tirar meu dia do lugar-comum. Hum... à tarde, eu visitaria uma escola. Uma chance ainda viva, viva! Fui. O recreio estava quase no fim. Aproximei-me de um grupo de alunos, e a conversa sassaricava livremente: ”Formou, mano!”. “Tipo assim, irado”. “Fala aí, ele ficou bolado?”. “Sinistro, pô!”. “Tipo assim, na moral”. “Demorô, malandro!”. “Tá zoando, Mané?”. “Tipo assim, porradão!”. “Rasga, vaza, cara!”. “Manero pra caramba batê um lero com a mina!”. “Ele tá ferrado!”. “Tipo assim, sarado!”. “Se liga pra num pagar sapo!”. Meu Deus, será que eles entendem o português que falo?! – perguntei-me.

Bem, as novidades não surgiram. Como quem não arrisca não conquista, continuarei em busca de algo novo. O que me conforta é que Luís Fernando Veríssimo também já caiu na cilada do “Tipo assim...”.

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